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Do sentir e não querer à supressão emocional

2016
joana_s.j_rodrigues@hotmail.com
Psicóloga clínica
Publicado no Psicologia.pt a: 2016-11-07

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Do sentir e não querer à supressão emocional

As emoções fazem parte do nosso dia-a-dia, durante toda a nossa vida, e para nos ajudar a lidar e a gerir essas emoções, utilizamos determinadas estratégias de regulação emocional, que vão sendo desenvolvidas ao longo da nossa vida. Quanto maior for o leque de possibilidades (de estratégias), mais facilmente conseguimos optar pela que se adequa mais a cada momento. E esse leque está mais aberto, quanto maior as nossas competências emocionais, que são o que descrevem a capacidade que cada um de nós tem em expressar as suas emoções, e deriva da inteligência emocional - capacidade de identificar os nossos próprios sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções dentro de nós e nos nossos relacionamentos.

A falta de competência emocional pode conduzir ao evitamento ou afastamento de pensamentos que criam uma activação emocional que nos transmitem mal-estar: supressão das emoções. Alguns dos sinais mais habituais de supressão emocional são: disfarçar ou evitar as emoções, evitar situações, lugares ou pessoas que criam uma emoção difícil de ser gerida, fingir que está tudo bem. Contudo, ao suprimir as emoções, podem-se estar a criar alguns outros problemas que levam a uma deterioração da saúde física e mental tais como stress, pressão alta, risco de diabetes, ansiedade, depressão, problemas de memória e as relações interpessoais facilmente podem ser afectadas. Por outro lado, diversos estudos demonstram que, quanto maior for o leque de estratégias e a diferenciação emocional, menor é a utilização da supressão emocional.

Um bom exemplo é a chamada “cara de poker”, em que por um lado estamos satisfeitos por nos ter saído um bom jogo mas inibimos a expressão emocional para os adversários não se aperceberem. Contudo, ao inibirmos a expressão emocional, não conseguimos evitar que a emoção seja experienciada, assim a emoção que é sentida como negativa ou desagradável, mantém-se por resolver. Determinados estudos demonstram que supressão emocional está relacionada com a perda de autenticidade, que acaba por “fingir”, o que exige mais da própria pessoa criando um maior desgaste. Este exemplo de “cara de poker” ou o exemplo de estar numa conferência e inibir a minha expressão emocional associada ao receio da minha prestação, são situações em que efectivamente o resultado é positivo (conseguir enganar os meus adversários no jogo de poker e não me mostrar muito ansioso perante a plateia). Contudo, é essencial a consciência de que em outros momentos, este “fingimento” pode estar a dificultar-nos a aprendizagem de uma gestão emocional mais adaptativa.

Para conseguirmos regular as nossas emoções e desenvolver as competências emocionais é importante aceitarmos que as emoções desagradáveis fazem parte da vida e que são tão válidas como as agradáveis e, que não vamos conseguir não sentir as sensações desconfortáveis, incómodas e dolorosas no nosso corpo. Em vez de lutarmos contra as emoções desagradáveis, fingir que não as sentimos ou escondê-las com máscaras, é essencial que as consigamos aceitar, o que está longe de significar que nos resignamos. Mas aceitar que as emoções estão lá, permite-nos procurar em nós diferentes formas para as gerir e só assim crescemos emocionalmente.

 

Por decisão pessoal, a autora do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

 

Joana de São João Rodrigues

Joana de São João Rodrigues é Psicóloga, Membro Efetivo da Ordem dos Psicólogos e especialista em Psicologia Clínica e da Saúde. Possui licenciatura e mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa. É Pós-Graduada em Educação Social e Intervenção Comunitária e Membro Associado da Associação Portuguesa de Terapias Comportamental e Cognitiva. É Formadora Certificada pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e pelo Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua. Desenvolveu actividade clínica de apoio a doentes com doença oncológica e seus familiares no Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil do Centro Regional de Oncologia de Lisboa, no Serviço da Clínica da Dor. Deu apoio psicológico às famílias e crianças com cardiopatias congénitas internadas no Hospital Vall d'Hebron para cirurgia através da Associació d'ajuda als Afectats de Cardiopaties Infantils de Catalunya (Associação de ajuda aos Afectados por Cardiopatias Infantis da Catalunha), em Barcelona. Desenvolveu actividade de apoio às necessidades das mulheres vítimas de violência doméstica/abuso sexual, pela Associação de Mulheres Contra a Violência, em Lisboa. Esteve integrada em diversos projectos de Cooperação Internacional, onde deu formação na área da promoção da saúde em Angola e Guiné-Bissau e foi técnica de cuidados continuados integrados de saúde mental na Associação para o Estudo e Integração Psicossocial, em Lisboa. Desde 2011 exerce clínica privada com jovens, adultos e seniores e desde Março de 2016 que integra a Equipa da ClaraMente - Serviços de Psicologia Clínica e Psicoterapia, com o objectivo de promover a saúde mental e a qualidade de vida, disponibilizando serviços de Psicologia Clínica e Psicoterapia em consultório em Lisboa e Caldas da Rainha. Desde Abril de 2019 que trabalha no Hospital Lusíadas em Lisboa, nas Unidades de Tratamento de Dor e Oncologia.

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