Como sair da depressão?
andradesofia958@gmail.com
Mestre em Psicologia Clínica e de Aconselhamento. Formadora certificada pelo IEFP.
Muito se tem falado e debatido sobre o fenómeno da depressão, considerada uma doença “psíquica” ou “mental”. Até certo ponto, esta é uma afirmação correta pois, muitas vezes, o sofrimento é sobretudo “psíquico”. Veremos, no entanto, que o corpo do deprimido participa muito nesta doença, a qual é, na realidade, “global”, e afeta o indivíduo no seu conjunto, corpo e psiquismo - ou como também se diz, espírito.
De acordo com Pessoa (s.d) “a depressão anuncia-se num lugar onde tem um sentido, ou seja, no projeto do paciente ou como emissário das dificuldades do projeto. É na vida que se instala a depressão e acreditamos que é na vida que se sai da depressão”.
“A vida é, também feita de sofrimento e esse conhecimento introduz uma diferença que nos poderá conduzir à mudança uma vez que a depressão surge como uma manifestação do espírito que reclama por um caminho a trilhar, que quer crescer e desenvolver-se num corpo que lhe resiste” (Pessoa, s.d).
E como nos diz Fernando Pessoa no seu poema:
“Fiz de mim o que não soube,
e o que podia fazer de mim não fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
O termo depressão designa um estado que se traduz a afeções físicas ou psíquicas e que é reconhecível por determinados sintomas. Todos nós já sentimos tristeza, um pouco de desespero, uma deceção ou um estado de desânimo. Também é comum utilizarmos outras palavras sem ser “depressão”, como “andar triste”, “estar em baixo”, por vezes usamos o termo em inglês, que se traduz por “ter um breakdown”.
Importa referir, que a depressão é uma afeção mental que quando não tratada atempadamente, arrasta para o sofrimento não só o doente mas também daqueles que o rodeiam e pode, no limite, conduzir ao suicídio.
Coloco agora a questão: como podemos sair deste “estado depressivo”, de angústia e tristeza? De que forma estamos a tratar a depressão? Seria importante fazer uma reflexão sobre o assunto para tentarmos perceber e identificar os sinais, os sintomas e diagnosticar o problema.
Nesta sociedade de imediatismo e consumismo em que se promove a manutenção das máscaras, no automatismo do quotidiano, a farmacologia oferece-se como primeira escolha. Possibilita ao indivíduo ter maior motivação para a ação voltando às atividades que praticava anteriormente, experimentando uma melhoria subjetiva, “sente-se melhor, mais bem-disposto”. Porém, o bem-estar que o fármaco proporciona poderá privar o sujeito de uma experiência mais rica correlacionada com os acontecimentos da sua vida, impedindo-o de procurar um novo caminho, mantendo-o na superficialidade do não emocional.
Enquanto Psicóloga, acredito que a psicoterapia oferece a oportunidade de construir novos referenciais e organizar as coisas de outra forma, abrindo horizontes na intimidade da relação construída pelo tempo. Em casos muito específicos deverá ser considerado o uso de farmacoterapia adequado à gravidade do estado depressivo.
Neste processo psicoterápico, o indivíduo deverá ser encorajado a ocupar-se com atividades que lhe deem algum prazer como o desporto ou um hobby, este encorajamento deverá ser gradual e ter em conta a personalidade e os hábitos do indivíduo. O objetivo é criar hábitos de vida saudável para a promoção da saúde, devolvendo a vontade de viver ao sujeito.
Podemos afirmar, que existem duas maneiras de estar na vida, uma saudável, através da perceção criativa, em que se sente que a vida deve ser vivida dignamente, sendo a existência uma criação permanente, e a outra doentia, em que existe um relacionamento de submissão com a realidade externa, trazendo consigo um sentido de inutilidade, associada à ideia de que nada importa, que não vale a pena viver a vida.
O esforço para entrar em contato com o que é mais central na nossa existência, parece ser o mais importante, viver requer escolha e compromisso mas também a aceitação daquilo que não pode ser mudado.
Devemos ter serenidade para aceitar o que não pode ser mudado, coragem para mudar o que pode ser mudado e sabedoria para distinguir uma da outra. Para que haja transformação, é necessário criar condições para que o outro se transforme, seguindo a direção que para ele fizer sentido.
É no confronto com as nossas limitações humanas em luta para transformá-las, que descobrimos o caminho que devemos seguir, sendo a nossa principal tarefa tornarmo-nos na pessoa que somos. Como nos diz o poeta…
“Creio no mundo como um malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender…
O mundo não se fez para pensarmos nele
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar…
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar…”
Poesia de Fernando Pessoa
Sofia Alexandra de Jesus Andrade é psicóloga, especialista em Psicologia Clínica e de Aconselhamento. É Membro da Ordem dos Psicólogos Portugueses, e Membro Associado do MDM. É também membro de uma IPSS em Lisboa. É licenciada em Psicologia e Mestre em Psicologia Clínica e de Aconselhamento pela Universidade Autónoma de Lisboa, tendo realizado um mestrado via profissionalizante na Comissão de Proteção de Crianças e Jovens do Seixal, onde adquiriu competências pessoais e sociais com crianças e jovens em risco, onde atualmente trabalha. Realizou também um estágio de Licenciatura no Gabinete de Saúde Ocupacional da Câmara Municipal do Seixal, tendo desenvolvido um estudo sobre o levantamento do Absentismo Prolongado dos trabalhadores, bem como consultas de desabituação tabágica. Para além de ser formadora certificada pelo IEFP, e apoiar várias causas sociais, é participante ativa em causas voluntárias. Atualmente dedica-se também à escrita sendo autora do livro intitulado: “Crianças e Jovens em Perigo. Estudo de Casos Clínicos. 2.ª edição”, pelas Edições Vieira da Silva.