Ousadia...

A palavra há em mim.
Arraigada paixão
que funde corpo, alma,
pensamentos...

A palavra há em todos,
assim como estrelas habitam
o vazio do caos.

Por que só em mim
recai a maldição da idéia?

João Antônio da Silva Sampaio
in Poética da Visualidade

Quando penso na educação de nossos dias quase não vejo ousadia, quase não ouço falar em novidades ou mudanças, embora educação lembre transformação, dinamismo, criação.
Para que haja mudanças é preciso ousar! As mudanças trazem em si os germes de idéias espetaculares.

É preciso ousar transformar velhas receitas em novas fórmulas; ousar experimentar novos caminhos na prática de sala de aula, nas avaliações, na relação com os alunos.
Professores ousam quando escutam os alunos, quando dividem com eles a responsabilidade pela solução de problemas cotidianos e do grupo, quando podem ser espontâneos e éticos, quando podem ser afetivos e quando conseguem, sobretudo, ser criativos.

Por que há tantos empecilhos quando se pensa em criar, variar, experimentar? Por que fica um medo no ar sempre que algo novo desponta?
A maioria das pessoas se apóia no que deu certo, mesmo que tenha sido um sucesso aparente, ou apenas uma experiência razoável.

O conservadorismo traz segurança para quem se acomoda e não dá atenção às idéias. Para ousar também é preciso deslocar coisas, pessoas, pensamentos.
Talvez esse deslocamento gere muita angústia. Mas a angústia mobiliza e produz resultados.

Há muitos educadores e algumas instituições competentes experimentando o novo, apesar de todas as dificuldades sociais e culturais sempre presentes. Sei que representam a minoria, e sei também que as minorias já provocaram transformações sociais importantíssimas.
Atualmente parece penoso e até “perigoso” para a reputação de qualquer instituição privilegiar a formação, em detrimento da preparação para o vestibular ou para uma atuação alienada e morna na sociedade.

É difícil ser diferente da maioria e nadar contra a corrente. Mas precisamos insistir; resultados significativos começam a aparecer.
Há algumas semanas ouvi na rádio o depoimento do coordenador do vestibular da Unicamp e fiquei admirada e feliz. Infelizmente não me recordo seu nome mas quero transcrever aqui o recado que ele deixou para os vestibulandos, mais ou menos assim: - “Cheguem pontualmente e, sobretudo, venham tranqüilos. As provas foram elaboradas para que todos tenham a possibilidade de se sair bem...as questões são familiares e não há pegadinhas! (as famosas “pegadinhas” para confundir os alunos, lembram-se?). Portanto fiquem serenos e confiantes.”

Tive a sensação, prazerosa, de que esse professor gosta de ensinar e quer que os alunos aprendam; torce pelo aprendizado e não pelo prestígio de quem ensina.

Educar é criar possibilidades, criar condições dos alunos acertarem mais e muitas vezes, orientando-os na busca pelo auto-conhecimento através da valorização de suas habilidades.

É preciso continuar ensinando, sim. Porém, é urgente que se ensine adequadamente, respeitando as diferenças, as qualidades individuais e valorizando o que cada um tem para dar. Muitas escolas ainda massacram os alunos com um lastimável apreço pela padronização e uma quantidade de conteúdo infindável.

Tenho consciência de que estou repetindo palavras antigas, queixas de décadas passadas...
Vivo a experiência de ser minoria.
Não faz mal! A maioria não tem feito grandes progressos. A maioria continua sobrevivendo, repetindo as velhas fórmulas, esperando.
Viva a minoria que não espera e ousa. Viva!