Estamos perante as primeiras gerações de crianças e jovens que crescem, utilizando quotidianamente a internet. A rede é cada vez mais utilizada para satisfazer um maior número de necessidades. À vertente de investigação e de conhecimento, soma-se ainda a vertente de consumo, publicidade, lazer e ainda de convivialidade. Esta disseminação é fomentada por ministérios da educação de diversos países, não sendo acompanhada pela correspondente necessidade de formação.

Muitas ideias que nos parecem sólidas e evidentes, estão em profunda mutação. Citamos um pouco ao acaso: a ideia de autoria, uma vez que o texto está on-line a sua propriedade não é imediatamente evidente; a ideia de privacidade, pois colocar imagens ou pequenos filmes na net é quase um gesto maquinal; a ideia de amizade e de relacionamento afectivo que pode, do nada, transformar-se em algo muito intenso sem que as pessoas se conheçam a nível físico.

Os desenhos animados dos mais novos existem on-line e disponibilizam pequenas actividades. As redes sociais disputam também este público mais jovem com jogos dirigidos às suas idades. Para os adolescentes, a tudo isso somam-se as já tradicionais salas de chat ou programas de troca de mensagem instantânea como os vários messenger existentes no mercado.

Temos, pois, amplas franjas da população para as quais a internet é algo de evidente. A rede transformou-se num espaço de estar e de viver que, forçosamente, replicará formas de mal-estar social e psicológico. Mas que formas de mal-estar e de disfuncionalidade serão essas? A interrogação tem ainda poucos dados que possibilitem respostas. No imediato, podemo-nos socorrer de figuras que já fizeram algum furor mediático: a do viciado que privilegia a net sobre todas as outras áreas da sua vida pessoal; a do marido ou esposa mal casado que encontra uma aventura no mundo virtual; ou ainda a do jovem que é alvo de um predador que o ludibria na rede ou atrai-o ainda para alguma armadilha no mundo real. Está claro que existem ainda inúmeras nuances entre estes grandes esboços…

Interessa-nos ainda o modo como certas pessoas com dificuldades de relacionamento interpessoal se reinventam na rede como outro eu; ou ainda como outros dão azo a esferas dos seus eus, a desejos ocultos e as afirmam de uma forma, desbragada até, no contexto de certas plataformas virtuais…

Quais serão as consequências destes movimentos de centrifugação do eu no desenvolvimento psicológico? De que forma a perda da necessidade de coerência em plataformas internáuticas ou da ausência de consequências para determinados comportamentos virtuais (passe-se a contradição dos termos) serão reflectidas no sujeito psicológico?

O uso intensivo de computador pode até, fazer esquecer ou adiar certas necessidades corporais e fisiológicas… A multiplicação de identidades virtuais poderá ainda reforçar essa tendência de dissipação.

O que será, para os vindouros, existir?