No ano de 1917 o teólogo protestante e filosofo, Rudolf Otto (1869-1937) publicou o livro - O Sagrado ( Das Heilige), em que apresenta uma profunda  análise sobre as relações entre o que é racional e o não-racional, no campo da metafísica, indicando como não-racional o conceito de numinoso, e como racional o conceito de religião, que busca racionalizar o que identificamos como sagrado.

Em um contexto filosófico, o livro promove ao leitor uma grande identificação com os exemplos empíricos que são abordados.

O autor destaca a diferença entre se aprender sobre o que é sagrado e a experiencia de se vivenciar o sagrado nos momentos que se transpassam durante a vida. Uma coisa é conhecer sobre o sagrado, outra é experimentá-lo. E, também, o aponta  como algo que está intrínseco na natureza humana desde nossa origem e evolução,  sendo, o sagrado, portanto, um fenômeno que antecede as religiões (a priori), mas, que, por outro lado, gerou, naturalmente, tais movimentos religiosos (posteriori).

Neste aspecto, outros conceitos são abordados, tais como o de numinosidade, que é uma forma de se expressar as experiências em nossas vidas, em que sentimos estarmos mais próximos do que é divino, servindo como influência nas doutrinas e dogmas que as religiões pregam de um modo geral ao longo dos anos.

Tanto as religiões politeístas quanto as monoteístas permeiam, através do campo oculto e metafísico da fé, a noção de divindade, de numinosidade, de algo que é maior do que nós, bem como, onipotente, onisciente e onipresente. Ou o indizível, o indecifrável e o inatingível.

Os momentos de numinosidade mencionados no livro são embasados em noções religiosas que nos fazem reconhecer, sentir, desejar e buscar uma relação com o sagrado. E dentro deste campo numinoso há também um diálogo harmônico entre os conceitos de tremendo e de fascinante, que embora, em princípios opostos, neste caso, se relacionam efetivamente.

Quando presenciamos tais situações numinosas, mesmo por um lapso de microssegundos, sentimos algo de divino na ocasião.

Situações tais como, uma interligação de acontecimentos, dos quais, nos desfechos, percebemos uma perfeição na sucessão dos fatos; um encontro ao acaso com alguém em que se estava a pensar;  uma oração com fé em que se sente uma ''presença de espirito''; ou então, o exemplo mais numinoso, que é o do sentimento do amor.

Nada neste mundo nos dá uma percepção de numinosidade maior do que o amor, em seus diversos formatos. O amor entre um casal, o amor entre parentes, familiares, amigos, sobretudo, pelo próximo.

O amor em formato de paixão, por exemplo, principalmente na fase da adolescência, promove sentimentos de tremendo e de fascinante de forma muito possante, podendo ser considerado um caso empírico da harmonia entre estes opostos.

As ações e reações do amor que promovem os momentos de numinosidade são representadas, pelo afeto, pelo carinho, pela generosidade, pela cortesia, pela humildade, mas, sobretudo, pelas ações, reações e razões inexplicáveis.

Sobre os conceitos de tremendo e fascinante o autor aborda esta interconexão existente entre um e outro, que, de certa forma, nos faz reconhecer, com base no conhecimento dos significados destes dois conceitos, o quanto numinosos são os momentos de nossas vidas em que sentimos a presença do sagrado dentro de nós ou no próximo.

Tremendo é tudo que nos faz tremer. Trata-se dos conceitos vistos acima, como o amor puro na juventude; é todo o mistério, o desconhecido; mas, também é o amor na esfera fraternal, o amor ao próximo, ou, por exemplo, o amor cristão.

Estes exemplos são de caráter irracional, numinoso, dos quais, Rudolf Otto tenta racionalizar através de demais conceitos, em que os de tremendo e fascinante, embora literalmente irracionais, nos aproximam daquilo que interpretamos como sagrado, e, contudo, estabelecem um melhor diálogo entre o irracional e o não-racional; a razão e a emoção; a filosofia e a ciência, o ser humano e o divino; daquilo que é nada (o homem) daquilo que é tudo ( Deus).

Neste contexto, o autor exalta o cristianismo como religião que mais promoveu esta aproximação entre o efêmero e o sagrado, - a energia numinosa como um elo entre estes dois extremos, entre o que é físico e o metafísico, o explicável e o inexplicável, o existente e o inexistente.

É correto afirmar que isso se deve a presença de Jesus Cristo na terra e todos os manuscritos bíblicos sobre suas palavras e ações.

Mas, independentemente, da religião,  presenciamos o sagrado em nossas vidas em diversas ocasiões, e, assim, nos sentimos em um campo híbrido entre o céu e a terra; entre o mortal e o imortal; o visível e o invisível; o tangível e o intangível; o material e o espiritual, o natural e o sobrenatural, e ainda, entre o tremendo e o fascinante.

O numinoso-tremendo está relacionado também ao temor à ira de Deus. É a consciência de que não somos nada e de que Deus é tudo; é a certeza de uma morte em vida e de uma vida que busca a eternidade; é a convicção de que não sabemos de nada. É o lado assombroso da numinosidade.

Ao mesmo tempo, que tememos e trememos, nos envolvemos e nos fascinamos, gerando uma harmonia entre estes dois extremos.

O numinoso-fascinante está relacionado a divindade de Deus, ou qualquer momento em que sentimos o sagrado, independentemente de crença e religião. Sobretudo, nos faz querer se aproximar cada vez mais deste sentimento.

No campo da Física, por exemplo, podemos ressaltar que toda nossa energia, bem como nossa frequência, velocidade e vibração são sempre modificadas quando sentimos e cultivamos  nossa fé e nossa busca pela sagrado-numinoso.

Ainda na Física, podemos também destacar os fenômenos naturais como numinosos, -tremendos e fascinantes, como, por exemplo, as gigantescas ondas oceânicas, os raios do céu, dentre outros, dos quais sabemos que não podemos ter nenhum tipo de contato físico, mas, ao mesmo tempo nos fascinamos.

Na Psicologia Analítica, Carl Gustav Jung (1875-1961), influenciado pela obra de Otto, associou o conceito de sagrado e de numinosidade com sua teoria do inconsciente coletivo, bem como sobre os arquétipos como elementos numinosos e sagrados.

Enquanto Freud estudou o inconsciente individual, Jung estudou o inconsciente coletivo.  Na Psicologia Junguiana todos nós recebemos esta energia, advinda, não apenas do campo físico, mas também de um campo espiritual ( no que diz respeito aos fenômenos não mensurados pela ciência) e que influencia involuntariamente no inconsciente. E uma vez que o inconsciente humano se comporta de forma autônoma, tais arquétipos podem se manifestar na personalidade independentemente de época e da cultura vigente e da personalidade individual. Entretanto, assumem diferentes formas, de acordo com a época, a cultura vigente e a personalidade individual.

Reconhecer tais fenômenos arquetípicos significa reconhecer um elemento sagrado e numinoso, tanto tremendo quanto fascinante: tremendo por ser desconhecido e por requerer ainda mais controle, entre o nosso ego e a nossa mente inconsciente, para que esta não nos surpreenda inconvincentemente, contra a nossa vontade, mas sim, trazer à luz do consciente nossas mais profundas necessidades, gerando o chamado eixo ego-self; e é, também, fascinante, porque nos mobiliza à tal diálogo entre mente consciente e inconsciente, constantemente, em busca de auto-conhecimento.

Por analogia, podemos facilmente comparar os arquétipos junguianos, bem como a mente inconsciente, como a nossa constante busca pelo o que é sagrado-numinoso. Pois, assim, como Deus, o amor ou mesmo um trovão da natureza representam o inatingível, o intangível ou o indizível, tanto tremendos quanto fascinantes, assim também é a mente inconsciente, os arquétipos e o inconsciente coletivo: estamos sempre buscando uma aproximação sem nunca conseguirmos obter um domínio pleno.

Sobretudo, entretanto, cada vez mais a teoria Junguiana é reconhecida pela comunidade científica, de forma que o conceito de numinoso de Otto também se insere neste contexto.

Atualmente, por exemplo,  não são apenas psicólogos que pesquisam o inconsciente coletivo no Instituto de Jung, na Suíça, mas sim, também, muitos físicos, que procuram conjugar tal teoria com os conceitos da física, mais precisamente da física quântica, através de estudos, por exemplo, da interconectividade, da não-localidade, da transcomunicação, dentre outros.

De um modo geral, tanto Psicólogos quanto Físicos, religiosos e não-religiosos, todos nós, reconhecemos este poder divino, seja este identificado no campo interno ou externo. É uma força superior incontestável, tremenda, fascinante, numinosa, e para os que se alimentam de sua fé, - sagrada.