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Livre-se do perigo de confundir um psicólogo com um "amigo"

2019
apsicologasara@gmail.com
Psicóloga. Psicoterapeuta (Cédula Profissional Nº 10418). Gestora de Formação e Formadora Certificada (CAP N.º EDF 46361/2005). Escritora.

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Livre-se do perigo de confundir um psicólogo com um "amigo"

Confesso que sinto o peito a rachar sempre que percebo que, em pleno séc. XXI, ainda existem muitas crenças equivocadas sobre a psicologia, e muitas pessoas ainda têm preconceitos em relação aos cuidados do psicólogo, às suas práticas (sendo uma delas, a psicoterapia), ao papel do psicólogo e à própria natureza da relação terapêutica entre o profissional e o seu paciente.

Seja eu realmente paciente! ;) Pois se a psicologia figura no imaginário das pessoas de muitas maneiras, cabe, justamente a nós, psicólogos, desmistificar muitas coisas que ficam a meio do caminho e que podem gerar alguns constrangimentos ou outras tantas confusões na cabeça das pessoas.

Eis o bê-á-bá básico (mas ainda ignorado por muitos) sobre, afinal, o que faz um psicólogo! Um psicólogo desenvolve um conjunto de conhecimento válido e confiável com base na investigação e aplica esse conhecimento aos processos psicológicos e ao comportamento humano (sentimentos, emoções, pensamentos e toda a parte mais subjectiva da nossa experiência enquanto seres humanos), em diversos contextos e no tratamento de diversas problemáticas específicas.

Então, porque é que é fundamental para um trabalho terapêutico (digno desse nome) o facto de se recorrer a um elemento externo à vida de uma pessoa para que a ajuda efectivamente possa ocorrer?!

Meu querido(a)! Simples. Porque um psicólogo é um técnico especializado, livre dos juízos de valor, das expectativas, das vontades e das opiniões que os amigos e os familiares têm sobre nós. Este distanciamento e essa neutralidade técnica permitem à pessoa desenvolver novas formas e qualidade de ser e de estar com os outros. Cada pessoa adquire um conjunto de capacidades e novas competências muitas vezes anteriormente desconhecidas, fruto de um trabalho que é feito a dois, semana após semana, com vista ao desenvolvimento do melhor potencial de cada um.

Há uma frase de José Saramago que adoro e que se pode aplicar muito bem a este contexto: “É necessário sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não sairmos de nós”.

Este "Ver" é o fruto de um trabalho a dois, que nasce de uma relação particular entre duas pessoas, e que inaugura um novo espaço e um novo tempo na vida de cada um, assim como um novo modo de “Ser”, verdadeiro. É aí que qualquer que seja o seu anterior “estar” pode ser reformulado, transformado, reconstruído e potenciado numa psicoterapia, através do diálogo (esse mediador de ‘mundos’, interno e externo, e veículo de ligação entre o “eu” comigo mesmo e com o próprio mundo à minha volta) como elemento principal na resolução das questões cognitivas, emocionais e comportamentais que possam estar na base de qualquer “problema”.

Como decerto compreenderá, "ver" é muito diferente de "olhar"... Tal como "escutar" não é simplesmente "ouvir". Um psicólogo, desde logo, na faculdade aprende a “escutar”. É uma escuta completamente diferente dessa que você tem com os seus amigos, por exemplo.

A escuta activa (tecnicamente chama-se assim) que o psicólogo faz em relação aquilo que lhe diz, permite a interpretação e conceptualização do seu conteúdo (dentro das dimensões não apenas do que é “dito”, mas também ao nível do “não-dito”, ou seja, o discurso implícito para além do que podemos dizer explicitamente) e – resumindo, abreviando e descomplicando parte deste processo – isso tudo no fim de contas fará com que uma pessoa possa começar a ver coisas que não via antes, a entender outras tantas coisas que provavelmente o leitor não entenderia antes, para a partir disso, natural e consequentemente começar a fazer coisas que não fazia antes e a ter resultados que também não tinha antes.

Um dos melhores elogios que já ouvi foi quando uma paciente, uma vez, ao final de uma sessão, atende o telefone e diz a quem estava do outro lado: “Estou a sair da psicoterapia, sabes o que é? É o sítio onde tu podes falar e a outra pessoa está MESMO a ouvir o que tu estás a dizer”.

Esta escuta profunda, totalmente centrada no que a pessoa nos está a dizer, não é o tipo de escuta “normal”, à qual estamos habituados, que geralmente consiste em ouvir (e parabéns se tiver na sua vida alguém que, pelo menos, o oiça!) o outro mas justapondo o que ele diz ao nosso próprio universo pessoal, de forma auto-referencial. Ouvir é simplesmente o elemento físico do escutar. Assim, escutar é o processo de descodificar e interpretar activamente as mensagens verbais (e não verbais).

 

Mas... aqui entre nós:

 

– quando é que foi a última vez que se sentiu ouvido(a)?

– ou verdadeiramente escutado(a)?

– sente genuína atenção das pessoas quando fala com elas?

– sente-se constantemente interrompido(a)?

– e mal-interpretado(a)?
 

Muitas vezes ouvimos os outros sem prestar atenção, ou seja, não percebemos o outro, não acedemos realmente ao seu “mundo”, à sua subjectividade, à sua alteridade. Na vida de todos os dias, em geral, grande parte da informação que recebemos num diálogo não chega correctamente, ou então é mal interpretada pelo ouvinte. E porquê?! Porque escutar activamente dá muito mais trabalho… e envolve um grande esforço consciente.

Então, talvez já tenha começado a entender que um psicólogo não lhe dá palpites ou opiniões, como poderá fazer um amigo ou familiar ou qualquer outra pessoa “não-estranha”, que baseia os seus pontos de vista em “achismos” particulares ou no tipo de papel pré-definido à partida que estabelece consigo.

Quando fala com um psicólogo, uma pessoa recebe aquilo que nós chamamos de “devolução” na forma de um conteúdo trazido pela pessoa que é trabalhado, ou seja, o psicólogo irá ajudá-lo a lidar com todo esse seu material, seja para desenvolver estratégias para que uma pessoa resolva as questões que afectam a sua vida, seja para entender melhor o que aconteceu, ou ultrapassar algum tipo de sofrimento emocional, seja ainda para planear acções futuras. O psicólogo “pega”, considera e trabalha terapeuticamente sobre esse seu material com vista ao encontro de caminhos para a gestão e superação de uma determinada dificuldade (desafio, melhor dizendo!).

Nós, psicólogos, realmente estudamos abordagens, métodos e técnicas para saber como ajudá-lo. Não, não é “pagar para alguém o ouvir”, simplesmente, como algumas pessoas ainda parecem acreditar (?!?). Nós somos treinados, entre muitas outras coisas, para saber escutar, filtrar a informação, interpretar e saber como redireccionar aquilo que você mesmo quer.

A terapia serve para acolher mas também para desafiar. Serve para encontrar soluções, mas também para criar as suas próprias. E os melhores psicólogos sabem bem disso. Porém, a procura de intervenção psicológica é um passo muito importante e difícil de dar, que pode gerar medo e desconfiança.

Para as pessoas que nunca foram a um psicólogo, o motivo da sua apreensão  pode estar acima de tudo no facto de desconhecer como funciona uma terapia ou qual é – verdadeiramente – a função de um psicólogo.

A ver, portanto, se nos entendemos: o psicólogo ou a psicóloga, que embora se preocupem com o seu bem-estar bio-psico-social, não são seus “amigos” e muito menos a sua mãe, o seu pai, o seu chefe ou o juiz ou sequer o seu “conselheiro”.

E a verdade é esta: fazer terapia não é um ato de fraqueza ou loucura. É uma demonstração de coragem, lucidez, força e determinação para mudar o que o impede de ser feliz!

Um acompanhamento psicológico cuidado irá devolver-lhe a autonomia de poder lidar com os seus problemas, à medida que você tem um profissional ao seu lado que irá ajudá-lo a perceber aspectos de si mesmo(a), dos outros e da sua vida que você não está a conseguir perceber ou lidar.

Não espere, portanto, chegar a um estado calamitoso para fazer aquilo que no seu íntimo talvez você já sabe que deve fazer.

Um amigo oferece-lhe as suas próprias opiniões. Um psicólogo oferece-lhe um caminho para encontrar as respostas. Fale com um amigo se quiser colo, mas se quiser verdadeiramente resolver uma situação, a pessoa certa com quem falar é o psicólogo.

Em 14 anos de profissão, já percebi que a terapia não é para todos e aqueles que procuram costumam ser as pessoas mais saudáveis do seu núcleo familiar, pois eles inquietam-se com os seus sintomas. As pessoas realmente doentes emocionalmente são aquelas que nunca mudam ou se questionam sobre nada. Por isso, costumo dizer, que só me ocupo de quem quer realmente melhorar, os que não querem não “sobrevivem” a mais do que uma ou duas sessões. Sou exigente comigo mesma e com os outros e a quem quer trabalhar de forma séria, e dedicadamente coloco a minha alma e todas as minhas forças para que melhore e supere/vença mesmo as suas questões.

Na minha vida pessoal, quando me vêm contar que sabem de alguém que está a passar por A, B, ou C e que a coisa parece estar complicada por X, Y ou Z, a pergunta que faço é sempre esta: “Mas, já conversou com algum psicólogo?” e percebo que, por vezes, esta pergunta surpreende muita gente. Aliás, descobrir que os momentos mais difíceis chegam sempre e que é possível aprender a lidar com eles de uma maneira mais saudável, também não é comum. E é isso que eu realmente gostaria de ajudar a transformar.

Enfim, o texto já vai longo, mas garanto-lhe que - sobre este assunto - bem que poderia ficar aqui a escrever até 2020.. aha! :) Espero apenas mostrar-lhe de que forma procurar os serviços dos psicólogos pode ser sem dúvida um ponto de viragem crucial na sua vida e poder transmitir-lhe como o nosso trabalho pode (e deve) gerar positividade, crescimento e desenvolvimento. Os psicólogos não mordem e nem são coisa para doidos. É algo a que você recorre sempre que precisa.

Não tenha medo da mudança. Ela assusta, mas pode ser a chave daquela porta que o leitor tanto almeja abrir.

Bom, talvez o coro de dúvidas na sua mente talvez prossiga com mais questões: “E sobre a terapia? O que é realmente? No que é eu me pode ajudar?”. E sobre “O que é que eu devo dizer ao psicólogo? Posso chorar? Não posso chorar? Posso contar piadas?”, por exemplo! :) Nestes 2 vídeos, em baixo, explico-lhe tudinho e deixo uma mãos cheia de "dicas" que espero que lhe sejam úteis. 

Para desvendar tudo, visualize os seguintes vídeos:

https://youtu.be/VJT_Jegt98w

https://youtu.be/IqFyv7ZUoZE


Torne todas estas dicas e conhecimentos úteis para alguém. Repasse a um(a) amigo(a) que você acha que poderá beneficiar-se com esta informação. Desejo-lhe uma óptima semana!

Lembre-se também de me escrever a dizer o que achou, se estas informações, materiais e conhecimentos foram relevantes e se os mesmos ajudaram, de alguma forma, na sua caminhada, rumo à sua jornada de crescimento pessoal.

Um abraço,

 

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Sara Ferreira

Sara Ferreira é psicóloga, psicoterapeuta, com formações especializadas na área da Psicologia Clínica e da Saúde e Psicologia Comunitária, sendo actualmente também autora e co-autora em diversas publicações técnicas e científicas de renome, assim como portais de referência na área da Psicologia, desenvolvimento pessoal, saúde e bem-estar. Membro Efectivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses, Licenciada em Psicologia Aplicada pelo ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, com experiência curricular e profissional no acompanhamento psicológico de utentes (ambulatório e consultas externas) na Unidade de Psicologia do Hospital de Santa Marta em Lisboa, exercendo actualmente a sua prática clínica maioritariamente em contexto privado. Colaborou como psicóloga na Direcção de Serviços de Psiquiatria e Saúde Mental da Direcção-Geral da Saúde, e em diversos projectos da Comissão Europeia, nomeadamente nas redes EAAD – European Alliance Against Depression e IMHPA – Implementing Mental Health Promotion Action, tendo também colaborado na preparação e edição do Programa Nacional de Luta Contra a Depressão, no contexto de programas prioritários do Plano Nacional de Saúde 2004-2010. Colaborou no Grupo de Coordenação da Saúde, no contexto da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, tendo também desempenhado funções de investigadora em diversos projectos de investigação e grupos de trabalho nacionais e internacionais sobre boas práticas em saúde mental e na área da Psicologia da Saúde, nomeadamente, a European Health Psychology Society.

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