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Saber lidar

2019
sara.aguiar.silva@gmail.com
Licenciada em Educação Social e Mestre em Gerontologia Social. Autora do livro infantil “Onde está a minha mãe?” da Flamingo Edições.

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Saber lidar

Quando falamos da morte, as sensações não são iguais. Há quem lide melhor, há quem aceite, mas também há aqueles que não sabem lidar, preferem não abordar e distanciar-se do assunto. Este tema surge como um tabu desde sempre, talvez na expetativa de, ao não falar dele, ele não nos seja tão próximo e não tenhamos que lidar com isso. A verdade, é que a morte acontece todos os dias, seja a pessoas próximas de nós ou a quem nunca ouvimos falar. Mas ela marca a sua presença dia após dia.

E depois, quando acontece a alguém próximo de nós? Se nunca falamos, nunca nos preparamos, se fugimos a sete pés do assunto, como vamos estar preparados para gerir todas as emoções que surgem num ápice nesses momentos de dor e tristeza? A resposta é simples. Não vamos estar preparados! Vamos afundar num momento de grande tristeza, não vamos saber falar do assunto, vamos pintar um cenário negro e demasiado doentio. A morte é um assunto cultural, mas também muito pessoal. Nós vivemos as celebrações tal como “manda a tradição” quer concordemos ou não. Faz parte. O preto, as lágrimas, os adornos utilizados, as palavras ditas. Tudo carrega em si um peso difícil de carregar. Mas ainda bem que há o outro lado, aquele no qual podemos ver tudo de uma forma mais ténue. As flores. Há tantas e tão lindas que parece que estamos num jardim. Torna tudo mais mágico e acolhedor. Os abraços de quem nos quer bem e gosta de nós. As lembranças que surgem em conjunto e que fazem ter a certeza que valeu a pena ter conhecido. A certeza que “a vida continua a significar tudo aquilo que sempre significou”.

Quando, finalmente, nos apercebemos do que aconteceu e sentimos que o “para sempre” é demasiado tempo, temos de aprender a lidar com isso. A vida segue como sempre seguiu. A melhor forma de o fazer é sentir a presença todos os dias. É falar, é lembrar, é observar. É tornar tudo natural. Não podemos reverter a situação porque não está ao nosso alcance fazê-lo. Mas podemos viver! Vão haver dias em que a saudade nos destrói por dentro, porque sentimos a falta do abraço, do toque, do cheiro. Mas também vão haver outros em que nos vamos rir muito de coisas que também nos faziam rir antes. Não vamos falar no passado, “ela era assim, gostava disto ou daquilo” mas “ela é assim, gosta disto e daquilo”. Vamos dar a conhecer a quem nunca conheceu. Como? Contanto histórias, relembrando momentos.

O “para sempre” é sem dúvida muito tempo, mas não vai ser esse tempo que nos vai fazer esquecer ou apagar todas as memórias, muito pelo contrário, vai-nos avivar cada vez mais a memória, porque à medida que o tempo passa, a memória é a única que nos consegue suportar a perda.