Os lugares esquecidos da psicologia
simaopedromata@gmail.com
Licenciado e Mestre em Psicologia pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP). Membro efectivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP). Psicólogo na Norte Vida - Associação para a Promoção da Saúde e Investigador externo do Centro de Ciências do Comportamento Desviante (CCCD) da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Os seus interesses de investigação são o fenómeno droga, a exclusão social, a marginalidade urbana e a intervenção psicológica nos comportamentos adictivos. É ainda membro do Serviço de Consulta Psicológica nos Comportamentos Adictivos (SCPCA) da FPCEUP e estudante de Doutoramento do Programa Doutoral em Psicologia na mesma Instituição.

No decurso da nossa prática profissional enquanto psicólogos estamos formatados para um tipo de intervenção que se exerce num contexto controlado e protegido como é o contexto do Gabinete de Consulta. Por um lado, ao longo do curso de Psicologia somos desde cedo formados - e, até certo ponto, formatados - para a aprendizagem e o domínio das técnicas de intervenção psicológica em contextos que, salvo raras exceções, têm como centralidade os Gabinetes de Consulta Psicológica. Por outro lado, ao nível das representações sociais e coletivas, o psicólogo ainda é aquele profissional a que ao seu trabalho se lhe associa um Gabinete.
Contudo, ao mesmo tempo que existe esta “formatação interventiva” do psicólogo no Gabinete, a própria prática profissional deste vem chamar a atenção para a necessidade de alargar os seus territórios interventivos. Existem, pois, lugares da intervenção psicológica que permanecem sistematicamente ocultados e esquecidos da intervenção. Falo de contextos e atores que, devido ao seu sofrimento, à sua angústia e desespero, não conseguem, de forma autónoma, recorrer ao tão tradicional “ambiente clínico” propiciado pelo contexto do Gabinete. Pratica-se ainda uma Psicologia afastada e alheada dos contextos de vida das pessoas que procuram ajuda, como se ao psicólogo lhe coubesse apenas receber no seu Gabinete as “problemáticas” dos utentes que o procuram, não tendo que se deslocar in loco aos contextos onde tais problemáticas se desenrolam de forma espontânea.
O que fazer então para atender, para exercer a escuta terapêutica, a este conjunto de pessoas que não recorrem aos Gabinetes? Deverá o psicólogo permanecer sentado na sua poltrona à espera de que a mudança e a “vontade-para-a-terapia” se opere nesses que não os procuram? Tenho defendido em vários contextos que temos a obrigação de contornar as limitações inerentes a uma Psicologia de Gabinete, desenvolvendo respostas interventivas que se afirmem diretamente no contacto com as comunidades, nas ruas e nos contextos informais de onde brotam sofrimentos sociais e psicológicos de diferentes amplitudes e formas. Tudo isto numa espécie de Grounded Psychology ou, tal como tenho afirmado no campo das toxicodependências (contexto no qual trabalho), numa espécie de Psicologia de Baixo Limiar.
Torna-se, por isso, urgente que o psicólogo saia dos seus Gabinetes de Consulta e que se faça presente e exerça a sua profissão, devidamente enquadrada, nos lugares esquecidos ou escondidos onde permanecem muitos sujeitos que necessitam de ajuda psicológica mas que devido à sua situação social, económica, cultural ou outra não recorrem de forma autónoma aos Gabinetes onde comodamente costumamos trabalhar.
Simão Mata é licenciado e mestre em Psicologia pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP) e membro efectivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP). É psicólogo na Norte Vida - Associação para a Promoção da Saúde, bem como investigador externo do Centro de Ciências do Comportamento Desviante (CCCD) da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Os seus interesses de investigação são o fenómeno droga, a exclusão social, a marginalidade urbana e a intervenção psicológica nos comportamentos adictivos. É ainda membro do Serviço de Consulta Psicológica nos Comportamentos Adictivos (SCPCA) da FPCEUP e estudante de Doutoramento do Programa Doutoral em Psicologia na mesma Instituição.